APITO ABAFADO

Ironicamente, na véspera do 32º aniversário da revolução dos cravos, a justiça portuguesa voltou a dar um claro sinal de que alguns dos mais nobres ideais de Abril, permanecem em larga medida por concretizar.
Segundo um triste despacho do ministério público, uma das partes do processo Apito Dourado, onde se encontravam Jacinto Paixão e Pinto da Costa, foi arquivada por falta de provas.
Mas o que se passa em concreto ?
Segundo o que se pode concluir do referido despacho, fica absolutamente provado pelas escutas efectuadas, que o árbitro e seus auxiliares estiveram num hotel com prostitutas, que as mesmas foram pagas pelo empresário, então ligado ao F.C.Porto, António Araújo, que foi Reinaldo Teles que lhes pagou o jantar que antecedeu os encontros, e que existiram erros desse árbitro que favoreceram o F.C.Porto no jogo nesse dia disputado frente ao Estrela da Amadora.
O arquivamento dá-se então porque supostamente foi impossível traçar objectiva e materialmente uma ligação entre os serviços prestados à equipa de arbitragem, e os seus erros no referido jogo.
Ora, triste justiça a deste nosso pobre país...
Há pouco tempo, Portugal esteve em risco de assistir à absolvição de uma mãe (?!?) capaz de espancar a filha de oito anos até à morte, apesar de todas as evidências, e mesmo confissões, precisamente por não existirem materialmente provas do crime. Ao que sei, o processo ainda se encontra pendente de recurso, e não me admiraria nada que se acabasse por chegar a um desfecho absolutamente desfasado de uma realidade que qualquer leigo observa facilmente. Pior que isso, tenho a certeza de que se se tratasse de alguém com poder económico, político ou mediático, a absolvição e libertação seria já um facto consumado. Alguém tem dúvidas ?
Salvaguardando as distâncias entre a gravidade de um e outro caso, o comportamento da justiça parece ser semelhante, patenteando um completo autismo face a uma realidade exterior com a qual parece ter cada vez menos a ver, deixando ao invés a sensação que corre por conta de poderes externos, quer a nível económico, quer mesmo político (é incrível como certas investigações decorrem ao ritmo das alterações do panorama político-governamental, de que a Casa Pia será o caso mais paradigmático, mas de cuja fama este Apito Dourado também não se consegue livrar).
Não sou jurista, e prezo muitíssimo o princípio da presunção de inocência. Mas há casos e momentos em que o mesmo se parece confundir perigosamente com a iniquidade mais cruel, e com um afastamento entre a realidade da vida de todos nós e um sistema de justiça entorpecido, obtuso e, perdoe-se-me o pleonasmo, nada justo.
Este arquivamento por falta de provas, prova inequivocamente, isso sim, uma de três coisas: incompetência da investigação, falta de meios para a mesma ou, pior ainda, falta de vontade de a prosseguir, pois quem acompanha de perto o futebol, e parte do testemunho de quem o vive por dentro, sabe que todas as situações levantadas no caso Apito Dourado eram usuais e frequentes, estão muito para além dum simples F.C.Porto-Estrela da Amadora, atingiram o seu auge no início dos anos noventa - com o sinistro consulado de Lourenço Pinto, agora advogado de Pinto da Costa neste processo, no conselho de arbitragem da FPF, e com árbitros como Carlos Calheiros, José Silvano, José Guímaro, Francisco Silva ou Fortunato Azevedo, e com casos como as viagens ao Brasil, o “penafielgate”, os “quinhentinhos”, o abatimento de Marinho Neves, a “compra” do guarda-redes Acácio do Beira-Mar, o very-light na baliza do Farense, etc - e foram responsáveis por dezenas de resultados adulterados, perante a complacência de observadores, delegados e poderes federativos cúmplices activa ou passivamente, permitindo ao F.C.Porto, seu principal (não único, diga-se) beneficiário, a conquista de alguns títulos nacionais em condições absolutamente escandalosas, de onde destacaria os de 1989-90 e sobretudo os de 1991-92 e 1992-93.
Deste moribundo processo, que seguramente apenas irá condenar um qualquer seccionista do Gondomar (cada processo tem sempre o seu Bibi), resta apenas a consolação de a sua abertura ter acabado por possibilitar ao Benfica a conquista de um título, do qual andava arredado havia uma década, pois sem Apito Dourado, e todo o circunstancialismo derivado do mesmo, duvida-se seriamente que um sistema tão eficaz e oleado deixasse um clube de fora do seu arco dominante, conquistar um título num campeonato tão equilibrado como o de 2004-05.
Até quando o nosso país se terá de debater com o cancro que representa esta justiça tão cruel,tão ignóbil e tão injusta, que vai minando corrosivamente as entranhas do estado democrático?

4 comentários:

cj disse...

ficaria eu muito surpreendido se fosse outro o desfecho...
sabes que o futebol envolve muitas outras componentes sociais, culturais e...regionais; é perigoso abanar muito a coisa, na presunção que o mal menor é muitas vezes a solução adequada para ultrapassar problemas neste país de brandos costumes.

Anónimo disse...

vergonha nacional, pois um pais de brandos costumes onde se compram arbitros, jogadores, funcionarios da fpf, observadores, etc, etc, ná tudo isso faz parte do imaginário, talvez deveremos prender e condenar os que investigam, pois eles inventam tudo, fazem uma novela tipo tvi, eles devem também estar com as televisões, são directos exclusivos... enfim força aí Valentim, P. Costa, e todos os outros metam o estado de merd... em tribunal, e depois com muitos milhares de € , já poderão voltar a comprar, a oferecer prendinhas...(e assim vai o país que fez uma revolução para tirar uma ditadura fascista e depois implantou uma ditadura democrática, rsrs)

Anónimo disse...

É uma farsa esta justiça e este país.
Prendem-se só os miseráveis, e estes colarinhos brancos ficam sempre impunes.
O futebol português está de luto

Anónimo disse...

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