O NOSSO REI

Sabíamos que um dia teria de acontecer. Porém, nunca estamos devidamente preparados para ver partir aqueles que nos são queridos. Achamos sempre cedo demais, mesmo quando o tempo vivido foi suficiente para deixar uma marca profunda. Eusébio deixou uma marca profundíssima, quer no Benfica, quer no país. Pelo talento que fez dele um dos maiores jogadores da história do futebol mundial, e também pela dimensão humana que sempre soube aliar ao sucesso que atingiu. Foi a conjugação dessas duas vertentes que o transformou numa lenda. É esse traço incomum que não deixa espaço a quaisquer comparações, podendo, e devendo, servir de exemplo a todos – dentro ou fora do desporto. Eusébio é Benfica escrito com sete letras diferentes. É, e sempre será, o nosso supremo Rei. Não foi ele que criou o clube, mas foi ele que criou o clube grandioso que a minha geração herdou. Um mero olhar estatístico permite facilmente reconhecer um Benfica antes, e outro depois, do Pantera Negra. Infelizmente, já não cheguei a tempo de o ver jogar ao vivo. É algo que lastimo, e que, confesso, me faz sentir de certa forma amputado no meu benfiquismo. Também não privei com ele. Deu-me um inesquecível autógrafo em 1983, à porta do antigo Estádio da Luz; e apertei-lhe a mão, bastantes anos mais tarde, numa ocasião de circunstância. Mas não é preciso muito para se conhecer Eusébio, tal o seu gigantismo, tal a sua transparência, tal a sua simplicidade. O King foi, é, e continuará a ser, demasiado grande (e para se ser tão simples é preciso ser mesmo muito grande), como jogador, e como figura histórica nacional e internacional. Sobrepôs-se ao país. Sobrepôs-se até ao próprio Benfica. Foi único. É único. Muitas palavras têm sido ditas, e escritas, nos últimos dias, a seu respeito. Dir-se-ão, e escrever-se-ão, muitas outras. Mas todas elas serão sempre insuficientes para traduzir fielmente o seu legado. A fasquia que Eusébio nos deixa é altíssima. Teremos agora de saber estar à altura da sua memória. É esse o nosso desafio.

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